Certa
vez, em Israel, fui tomar um ônibus para Jerusalém, e quando cheguei no ponto
vi que havia um ônibus da linha que eu precisava pegar, quebrado, aguardando
outro ônibus chegar para substitui-lo. Todos os passageiros que já estavam em
viagem haviam descido, e esperavam embaixo de um sol de 40 graus, ao meio dia.
Passados 15 minutos, chegou o outro ônibus e a viagem seguiu (para mim, começou).
O percurso até Jerusalém deveria durar mais ou menos 45 minutos. Ironicamente, porém,
após meia hora de viagem, nosso ônibus começou a apresentar problemas no motor.
Sentimos que estava sem força, e o motorista se esforçava muito para avançar na
estrada, trocando de marcha a cada segundo. Muitos dos passageiros começaram a
ficar estressados. Afinal, só faltava dar problema no segundo ônibus, que havia
substituído o que tinha quebrado! Nisso, quando todos perceberam o que estava
acontecendo, uma senhora explodiu de raiva. Começou a xingar o motorista,
dizendo que tinha um compromisso com hora marcada, como se o coitado do funcionário
tivesse alguma culpa pelo destino irônico de nossa viagem. A senhora ficou tão nervosa
e gritou tanto, que chegou a ficar literalmente vermelha. E eu só rindo dessa cômica
situação...
Essa
semana temos uma Parashá bem agitada, cheia de acontecimentos importantes e
decisivos para a história de nosso povo. Entre eles estão a Mitsvá da vaca
vermelha, o falecimento de Miriam e Aharon, a interação de Am Israel com outros
povos no deserto, e o famoso episodio de Moshe com a pedra. Vamos falar sobre
esse último.
O
povo reclamou que estava com sede. Após o passamento de Miriam, o poço que os
acompanhava no deserto lhes fornecendo água, secou. Hashem então disse à Moshe
que falasse com a pedra, e a mesma daria água para saciar a sede de todos. Porém,
Moshe, como todos sabem, bateu na pedra ao invés de falar. Apesar de a água ter
saído da mesma maneira, isso foi considerado um grande erro, decretando que
Moshe não entraria na terra de Israel. Essa passagem é talvez uma das que mais
levantam perguntas na Torá. A principal delas é sobre o erro de Moshe. O que
foi que ele fez de errado para ser punido tão severamente? Apesar de já termos
falado sobre isso em outro Dvar Torá, ofereceremos essa semana uma resposta com
um novo enfoque.
O
Rambam (1135-1204, Espanha, Egito) discute em seu livro Shmona Prakim as emoções
humanas. Segundo ele, o judaísmo prega por uma “inteligência emocional” que
todos adquirem com a pratica, a despeito da personalidade de cada um. Essa inteligência
emocional implica em sempre seguir o caminho do meio em relação às emoções e
aos sentimentos. Não seja muito mão aberta, mas também não seja mesquinho. Não seja
muito medroso, mas uma certa quantidade de temor é importante em certas situações.
E assim por diante. Porém, existem duas emoções que o Rambam diz que devemos sempre
lutar para nunca sentir: fúria e orgulho. Desses dois, devemos ficar sempre longe.
Obviamente isso seria em uma situação ideal, uma vez que todos ficamos nervosos
em algumas situações. Mas devemos saber que isso é errado e temos de tentar nos
controlar.
Explica
o Rabino Lorde Jonathan Sacks que o erro de Moshe Rabeinu foi ter ficado
nervoso no momento em que o povo estava sofrendo, a ponto de chama-los de
rebeldes. Am Israel naquele momento (surpreendentemente, considerando o histórico
recente de suas ações), não havia feito nada de errado. Porém, o povo, ao ver
Moshe ineditamente nervoso, pensou que Hashem estava bravo com eles, e isso
acabou com a possibilidade de se fazer um Kidush Hashem, santificar o nome de D’us
naquele momento. Mas, se todos nós ficamos nervosos, por que com Moshe foi tão grave?
Moshe era o líder do povo, e tudo o que ele fazia era observado e muitas vezes
repetido pelo povo. Por isso foi julgado por Hashem com muito mais escrutínio.
Muitos
anos após a Torá, a psicologia chegou na mesma conclusão. Quando ficamos com
raiva, a parte mais primitiva de nosso cérebro, a amídala, é ativada, e nos faz
reagir com impulso, inibindo o córtex, a parte que raciocina logicamente, de
tomar conta de nossas ações. Sendo assim, devemos tentar controlar a raiva e a
fúria o máximo possível, para não acabarmos agindo por impulso, como a senhora
no ônibus em Israel. É preciso tomar muito cuidado para dominarmos
completamente a raiva e o sentimento de fúria, antes que eles acabem dominando
nossas ações.
Nenhum comentário:
Postar um comentário