Essa semana leremos a Parashá mais longa da Torá. Como era
de se esperar, há muito sobre o que falar. Vamos porém abordar um tema que não
é dos mais conhecidos, porém muito interessante. Um dos assuntos presentes
nessa porção é o do nazir. Quando uma pessoa decide se tornar um nazir, ele não
pode beber ou comer nada ligado ao vinho e à uva, assim como fica proibido
cortar o cabelo. Hoje em dia é muito raro encontrarmos algum nazir, porém em
Israel às vezes vemos um ou outro.
Diz o passuk que quando acabam os dias de nazir de alguém
(a decisão era tomada por um certo período de tempo), ele deveria trazer alguns
sacrifícios no Mishkan. Vamos analisar as palavras do passuk: “No dia que se
completarem os dias de nazir, ele deve traze-lo para o Mishkan" (para oferecer
os sacrifícios). Há nesse passuk uma conjugação muito estranha. A intenção da
Torá é dizer que o nazir deveria ir ao Mishkan. Porém a linguagem usada foi
“traze-lo”, como se houvesse uma outra pessoa envolvida! O que isso quer dizer,
e porque a Torá usou justamente essa linguagem ao invés de dizer simplesmente
que o nazir deve ir ao Mishkan?
Rashi, como já estamos acostumados, explica a primeira
pergunta. A expressão “traze-lo” no passuk não possui nenhum significado
especial. Na verdade é exatamente como falamos. A explicação é que o nazir deveria
ir ao Mishkan. Nas palavras de Rashi, “trazer ele mesmo ao Mishkan". Fica
então a pergunta: por qual motivo a Torá escreveu suas palavras dessa maneira,
em terceira pessoa?
Diz o Meshech Chochma (1843-1926, Lituania) que para
entendermos o uso dessa linguagem, devemos analisar o motivo pelo qual uma
pessoa decidia virar um nazir. Ele explica que essa decisão funcionava como uma
prescrição medica, para a pessoa obter um maior controle sobre as suas vontades
e o seu egoísmo. Esse objetivo era alcançado através dessa separação do
materialismo, representado pelo vinho e o corte de cabelo, por um certo período
de tempo. Quando terminavam os dias de nazir de uma pessoa, ela mudava. E essa
mudança fazia que ela se relacionasse com os seus próprios desejos da mesma
maneira que o fazia com o desejo de outra pessoa. Como assim?
Quando vemos que alguém está com muita vontade de comer um
petit gauteau, por exemplo, e não o queremos tanto assim, é muito fácil para
nós rejeitarmos o doce. Parece uma decisão simples, uma vez que não o desejamos
com a mesma intensidade que o outro. Mas para ele, provavelmente será muito
difícil dizer não ao petit gauteau.
O nazir, após completar o seu período de contenção, deveria
se relacionar com seus próprios sentimentos da mesma maneira como nós nos
posicionamos em relação aos de uma outra pessoa. E a Torá nos deu uma indicação
dessa mensagem ao dizer especificamente que o nazir deve “traze-lo” ao Mishkan,
como se estivesse falando de outra pessoa. Pois é assim que o nazir via a si
mesmo.
Não eram todas as pessoas que se encontravam no nível espiritual
tão elevado para virar um nazir. A própria Guemará diz que apenas pessoas muito
santas que viviam quase que fora da realidade desse mundo podiam tomar essa
decisão e conseguiam cumprir suas metas. Porém, o que sim podemos fazer é pegar
a ideia e tentar aplica-la em nosso cotidiano.
Muitas vezes pessoas tomam decisões baseadas em algum
desejo ou sentimento, e as executam com um impulso, sem refletir. O resultado
disso pode acabar sendo prejudicial. Todos possuem uma força de vontade que
lhes da a capacidade de se controlar, por mais difícil que pareça. Isso se
aplica em tudo, desde um regime até uma discussão, quando perdemos o controle e
dizemos algo que não deveríamos. O segredo é colocar o intelecto no volante de
nossas vidas, pensar e refletir antes de tomar qualquer decisão importante e não
agir compulsivamente. Como está escrito no livro do Tania, o intelecto se encontra
acima do coração.
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