Há poucas horas, estava eu trocando mensagens com um amigo
pelo famoso e imprescindível WhatsApp. Papo vai papo vem, ele me comentou que
se considera uma pessoa econômica, sempre tenta economizar em suas compras,
pagar o mais barato possível, porém que o fato de possuir um iPhone no bolso
contradiz o seu modo de viver, uma vez que existem celulares mais baratos. Ao
ouvir isso, ou melhor, ao ler isso, me senti um pouco incomodado. Afinal, eu
também me considero uma pessoa bem econômica (sou famoso por achar as famosas
“metsies” nos outlets quando estamos viajando), porém também estou
constantemente acompanhado por um iPhone. Então, após refletir um pouco,
respondi: “Não é verdade. O iPhone você investe numa qualidade que não existe
em outros aparelhos. Não há com o que economizar, você recebe pelo preço que
paga”. Estaria eu realmente convicto do que escrevi, ou será que eu não teria
apenas “criado” um bom motivo para eu ter um iPhone sem contradizer os meus
ideais anticonsumistas?
Na Parashá dessa semana, Yossef, atual governador do Egito,
finalmente revela para seus irmãos sua real identidade e revê seu pai, que não
via havia 22 anos. Logo após dizer quem ele realmente era, Yossef se dirigiu
aos seus irmãos com a seguinte pergunta:
“O meu pai ainda está vivo?” Parece normal e é esperado o fato do filho
perguntar sobre a saúde de seu pai, depois de ficar tanto tempo sem obter
nenhuma informação sobre o mesmo. Porém, se analisarmos os fatos um pouco antes
deste emocionante momento, veremos que cabe aqui uma pergunta óbvia.
Logo antes de Yossef se revelar, Yehuda proferiu um longo e
duro sermão, explicando para Yossef as implicâncias de Biniamin ser mantido em
cárcere no Egito. O motivo pelo qual isso não poderia acontecer era o fato de
Yaakov não aguentar o tranco de não ver o seu filho caçula voltar para casa. O
que pode se concluir daqui? Se Yaakov era o motivo para Yossef liberar Biniamin,
quer dizer que ele estava vivo! Por que então Yossef perguntou justamente isso?
O Beit Halevi explica que a frase “O meu pai está vivo?”
não foi uma simples indagação movida pela curiosidade. Yossef sabia que Yaakov
estava vivo. Então o que Yossef quis dizer ao perguntar sobre a saúde de seu
pai? Ele estava respondendo ao argumento de Yehuda. Yehuda assumiu que o certo
seria a prisão de Biniamin. Afinal, a taça de Yossef foi encontrada em seu saco
de comida, e apesar dele não ter cometido o roubo, não dava pra provar. Porém,
Yehuda argumentou que Biniamin deveria ser libertado devido à saúde de seu pai.
Caso o caçula não voltasse pra casa, Yaakov não aguentaria. A revelação de
Yossef foi exatamente uma resposta a isso: “Eu sou Yossef, meu pai ainda está
vivo?” Em outras palavras, Yossef quis dizer que quando os irmãos o venderam
como escravo e contaram para Yaakov que ele havia morrido, por que será que
eles não pensaram na saúde do pai? Por que só agora Yehuda está com o bonito
discurso sobre o sofrimento de Yaakov caso ele não veja o seu filho de volta, e
há 22 anos ele próprio administrou um plano que causou o mesmo sofrimento ao
pai, sem pensar em seu bem estar?
Após ouvirem tudo o que Yossef tinha a dizer, a Torá
nos conta que os irmãos entraram em choque. Claramente o principal motivo disso
foi por não acreditarem que aquele que havia saído um escravo, estava agora
ocupando o (segundo) maior posto no maior império da época. Mas também entraram
em choque por não ter uma resposta ao argumento de Yossef. Quando a verdade foi
jogada em suas caras, os irmãos ficaram sem palavras.
Dentro dessa dramática história, a ação de Yehuda pode
parecer um absurdo. Porém, verdade seja dita, também agimos assim em nosso dia
a dia. Mais do que inúmeras vezes, nos convencemos de que somos os donos da
verdade. Sem dúvida, o que estamos fazendo é o certo a ser feito. Sempre
encontraremos motivos. Assim como os irmãos nem se importaram com a saúde de
Yaakov quando mostraram a túnica de Yossef manchada de sangue, uma vez que tudo
o que lhes importava era se livrar daquele de quem tinham tanta inveja. Depois,
porém, quando o interesse era libertar Biniamin, o sofrimento de Yaakov passou
a ser o fator mais importante.
A própria pessoa é o seu melhor advogado. Motivos que certas
vezes são levados em conta, outras são completamente ignorados. Nem sempre a
verdade é jogada em nossas caras, porém quando isso acontece, nos damos conta
do quão falsos estávamos sendo. Uma realidade dura, porém verdadeira. Devemos
tentar viver às margens da verdade, procurar estar cercados de honestos motivos
e razões fidedignas para nossos atos. Isso só nos trará benefícios. E evitará
que fiquemos boquiabertos e sem palavras, como os irmãos de Yossef.
PS: para evitar um mal entendido, não estou tendo uma crise de identidade por ter um iPhone. Era mais pra dar um drama.
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