Nosso
patriarca Avraham Avinu ficou conhecido por passar em vários testes que Hashem
lhe propôs durante sua vida, e muitos destes acontecem em nossa Parashá. Logo
após chegar em Israel, após seguir a ordem de Hashem para deixar a casa de seu
pai, Avraham foi surpreendido por uma forte seca, que consequentemente trouxe
fome, e acabou sendo obrigado a descer em direção ao Egito. Assim que se
aproximou dos portões da cidade, Avraham disse para Sara não comentar que era
sua esposa, e sim sua irmã, e ele deu dois motivos para isso: primeiramente, para
não o matarem a fim do Faraó ficar com ela. Segundo, disse Avraham: “Para que
me façam bem por sua causa”. Que bem é esse?
Rashi,
que geralmente tem a função de nos ajudar a entender melhor o passuk, e
oferecer interpretações que dão sentido ao texto da Torá, nesse local parece
nos complicar bastante. Explica ele, que o bem que Avraham esperava que lhe
fizessem por causa de Sara era que lhe dessem presentes, ou seja, dinheiro e
posses. Praticamente todos os comentaristas perguntam a Rashi que esses
presentes estão fora de contexto. Avraham se encontrava na fila de imigração para
uma terra desconhecida, um império promiscuo, com medo de que lhe matassem e o
Faraó pegasse sua esposa. Como nesse momento ele poderia estar pensando em
presentes?! Quando alguém se encontra ameaçado, sob perigo de vida, a única coisa
com a qual ele deveria se preocupar é em se safar, sair vivo dali! Por que então
Avraham estava preocupado em levar um brinde dos Faraó e de seu povo?
A
vastidão da Torá, seu grande número de comentaristas e estudiosos, proporcionam
infinitas respostas para essa pergunta, porém encontrei uma explicação muito
bonita do livro Shem Mishmuel, escrito pelo rabino chassídico R Shmuel Borenstein
(1855-1910, Polonia). Diz o Midrash que não foi à toa essa ida de Avraham ao
Egito. Não era apenas um teste, como estamos acostumados. O verdadeiro motivo
pelo qual ele foi para lá era para “preparar o terreno” pra Am Israel, que ali
viveria por muitos anos, desde Yaakov e sua família até o Faraó liberar o povo
após as dez pragas e muitos anos de escravidão. E Avraham sabia disso. Portanto,
tudo o que ocorreu com Avraham no Egito foi espelhado posteriormente aos seus
descendentes, e foi de seu primeiro patriarca que eles tiraram a força para
sobreviver, lutar, e sair de cabeça erguida.
Realmente,
houveram muitas semelhanças entre a estadia de Avraham e a do povo judeu no
Egito. Após o Faraó tomar Sara de seu marido e a levar para os seus aposentos, um
anjo de Hashem começou a lhe punir ininterruptamente, sob ordens de Sara, o que
nos remete às 10 pragas que Hashem mandou ao Faraó sob intermédio de Moshe e
Aharon. Logo depois, quando o rei ficou sabendo que Sara era casada com
Avraham, lhes mandou embora imediatamente, com muita pressa, exatamente como
ocorreu anos depois, no episódio que marca a festa de Pessach. E os presentes
fazem parte disso. Houve uma promessa de que o povo sairia do Egito após a escravidão
com muitas posses e dinheiro, que foram dados pelos próprios egípcios. E a energia
espiritual para esse acontecimento também veio de Avraham, justamente pelo fato
de que o Faraó lhe deu presentes quando lhe mandou embora, exatamente como ele
havia previsto. Portanto, quando Avraham mencionou que por causa de Sara ele
receberia presentes do Faraó, não foi um acaso, e muito menos um interesse próprio. Ameaçado por um império perverso, ele estava preocupado em garantir que no futuro seus filhos sairiam do Egito com muitas
posses, como Hashem prometeu.
Existem
outros exemplos de como Avraham se importava com cada um de seus filhos. No inicio
de nossa Parashá está escrito que Avraham entrou em Israel e foi ate a cidade
de Shchem. Por que ele se dirigiu especificamente até essa cidade? Explica
Rashi que Avraham fez questão de ir lá para rezar pelos filhos de Yaakov que no
futuro lá guerreariam contra Shchem (o governador da cidade) e seu povo. Um
pouco depois, quando Avraham foi lutar contra os 4 reis a fim de resgatar seu
sobrinho Lot, o passuk nos conta que no meio de sua perseguição ele parou em um
local chamado Dan. Rashi explica que lá Avraham teve um momento de fraqueza,
pois era o lugar no qual seus filhos praticariam a idolatria, no pecado do
bezerro de ouro.
Já
se passaram mais de quatro mil anos desde o falecimento de Avraham. Porém, a
força de suas ações, a energia originada por sua preocupação e por seus atos
milimetricamente calculados, permanece nos fortificando e nos encorajando a
seguir em frente, praticando o judaísmo da melhor maneira possível. Que as pitadas
de luz acendidas por nosso primeiro patriarca durante toda sua vida prevaleçam
e continuem acesas em meio a tantos desafios e dificuldades que enfrentamos no
século 21.
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